Quando a repórter do Esporte Interativo Bruna Dealtry recebeu um beijo forçado, ao vivo, durante uma passagem no jogo entre Vasco e Universidade de Chile, em São Januário, esboçou uma reação que beirou a naturalidade.
Com ótimo jogo de cintura, ainda que em uma situação injustificável, a jornalista respirou fundo e “seguiu o baile”, como disse logo após o assédio sofrido.
Como muitas colegas de profissão, Bruna convive com a frustração de ser vítima diária de um ambiente que se caracteriza por abrir passagem para o discurso machista.
Não há dúvidas de que o universo do futebol é um verdadeiro catalisador da violência contra a mulher.
Desde sempre uma prática predominantemente masculina, o que acontece dentro das quatro linhas incita uma variedade de comportamentos, geralmente relativizados, que mais do que cruzam a linha do respeito às mulheres e ao público LGBT.
Ambos são vistos como estranhos na tribo.
Foi em meio a casos recorrentes, como o do dia 13/03, na estreia vascaína na competição sulamericana, que cerca de 50 jornalistas brasileiras se uniram por uma causa que pede o mínimo dentro da profissão: respeito.
Com a hashtag #DeixaElaTrabalhar, o grupo pretende responder aos casos relatados por repórteres esportivas pelo país, reunindo denúncias de quem teve que se esquivar de beijos, pegadas, xingamentos e até tentativas de agressão. Tudo durante a rotina de trabalho.
Rapidamente, a reivindicação ganhou o mundo.
Com a divulgação da tag pelos clubes das séries A e B do Brasil, a notícia chegou a 1,6 milhão de visualizações no Facebook e quase o dobro no Instagram. Pelo Facebook oficial do movimento e em tuítes, foram mais de 160 mil interações.
Além do endosso dos times, jornais internacionais como El País, BBC e Marca foram alguns dos mais de vinte veículos que repercutiram o tema, sem contar mídias nacionais, atletas, ex-atletas e artistas.
No campo da hipocrisia

Não por coincidência – principalmente por ser corriqueiro – o caso de violência na reportagem do Esporte Interativo aconteceu só cinco dias após o Dia da Mulher, comemorado no dia 8 de março.
Pelo Brasil, clubes estamparam mensagens positivas de impacto em prol da causa feminina, enquanto rosas eram dadas a mães, esposas e filhas.
Os atos, no entanto, não correspondem às doze mulheres assassinadas diariamente no país, rendendo ao Brasil o 7º lugar entre as nações mais violentas para o gênero em um ranking de 83 países, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Em território nacional, registra-se a morte de mulher a cada duas horas. Em um grupo de 100 mil habitantes, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, são quase 4,3 vidas tiradas.
Dos mais de 4470 assassinatos apontados em 2017, 946 se encaixam no quadro de feminicídio (quando o fato de ser mulher levou à execução).